Entrevista: regime jurídico do pré-sal está em desenvolvimento
Roseli Ribeiro em 27 March, 2011
Tuite
A indústria do petróleo no Brasil segue “as melhores práticas da indústria de petróleo no mundo, inclusive no tocante à documentação, onde são referência, por exemplo, os modelos de contratos elaborados pela AIPN (Association of International Petroleum Negotiators)”, explica o advogado Leonardo Miranda, que atua no setor de Infraestrutura e Financiamento de Projetos, do escritório, Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados.
De acordo com o especialista, o modelo escolhido pelo Brasil, para os investimentos na camada do pré-sal, é conhecido como “partilha da produção”, e utilizado mundialmente há várias décadas. “As peculiaridades do nosso modelo de partilha ficaram basicamente por conta da operação exclusiva conferida à Petrobras, sobre todo e qualquer contrato de partilha, bem como ao percentual mínimo de 30% no consórcio, também conferido à Petrobras”, esclarece o advogado.
Leonardo Miranda, formado em Direito pela PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), tem pós-graduação no IBMEC em Direito Empresarial, e na Univeristy of Dundee (Scotland), é membro do IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo), AIPN (Association of International Petroleum Negotiators) e o Britcham Brasil (Energy Committee).
Segundo o especialista, o valor que o investidor se propõe a oferecer para o governo será o “fator determinante” do sucesso nesse modelo de partilha da produção.
Contudo, Leonardo Miranda alerta que “o investidor precisa conhecer as regras, não apenas para fazer ofertas nas licitações, mas principalmente no que diz respeito às operações, tributação do setor e em geral, regras de contratação de serviços”. Esses são “fatores que impactarão na modelagem financeira do investidor”, completa.
Na avaliação de Miranda, a crise pontual no mercado árabe não deve interromper os investimentos exploratórios e de desenvolvimento respectivamente dos blocos e campos de petróleo no Brasil. “Por aqui, interessa muito mais saber o que vem pela frente em termos de edital de licitação e contrato de partilha”, afirma. Veja a íntegra da entrevista concedida ao Observatório Eco por Leonardo Miranda.
Observatório Eco: Qual a legislação que agora passa a regulamentar os investimentos no setor de petróleo, e quais os pontos importantes destas novas regras.
Leonardo Miranda: Vale esclarecer que não houve alteração na legislação de petróleo no Brasil, no chamado upstream. A lei de concessões de petróleo continua existindo e aplicável aos contratos existentes e aos futuros contratos que forem licitados sob o modelo de concessões.
A novidade foi a introdução de um regime adicional, dedicado exclusivamente ao chamado pré-sal, bem como a outras áreas exploratórias que o governo federal considere estratégicas, seja pelo baixo risco exploratório, seja pela alta rentabilidade, ou ambos.
Esse modelo adicional é o da chamada partilha da produção, conhecido da indústria há várias décadas, em tantas outras jurisdições. As peculiaridades do nosso modelo de partilha ficaram basicamente por conta da operação exclusiva conferida à Petrobras, sobre todo e qualquer contrato de partilha, bem como ao percentual mínimo de 30% no consórcio, também conferido à Petrobras.
Observatório Eco: De que forma investidores públicos e privados podem se reunir para investirem na exploração do petróleo?
Leonardo Miranda: Tanto o modelo de concessões, quanto o de partilha exige apenas que os concessionários, ou contratados, no modelo da partilha, constituam empresa no Brasil para poderem assinar o contrato, uma vez vencida a licitação.
Em geral, as empresas formam consórcios e celebram contratos chamados de “joint bid agreement”, que regulam a forma como as empresas em parceria se comprometem a participar das licitações, conjuntamente.
Além disso, a legislação societária brasileira é bastante sofisticada e permite diversas estruturas de parcerias e governança. Importante ressalta que a indústria do petróleo no Brasil segue as melhores práticas da indústria de petróleo no mundo, inclusive no tocante à documentação, onde são referência, por exemplo, os modelos de contratos elaborados pela AIPN (Association of International Petroleum Negotiators).
Observatório Eco: Qual o segredo para um grupo de investidores elaborarem uma oferta bem-sucedida para blocos de petróleo?
Leonardo Miranda: No modelo de concessões, além da disposição de ofertarem um bônus de assinatura substancial, são decisivos o programa exploratório e o compromisso de conteúdo local, a serem ofertados. Sem dúvida a parceria com empresas já habituadas ao mercado, em função de licitações anteriores, pode ser um facilitador.
No modelo de partilha, o fator determinante será o percentual da produção que o investidor se propõe à oferecer ao governo, como em qualquer modelo de partilha da produção.
Contudo, antes de qualquer coisa o investidor precisa conhecer as regras, não apenas para fazer ofertas nas licitações, mas principalmente no que diz respeito às operações, tributação do setor e em geral, regras de contratação de serviços, regras de conteúdo local, etc. São fatores que impactarão na modelagem financeira do investidor.
Observatório Eco: O que o senhor destaca de importante para o investidor na regulamentação de cada etapa: exploração, desenvolvimento e produção.
Leonardo Miranda: O conhecimento das regras em cada fase é essencial especialmente para os operadores. Há regras sobre como se prepara um plano de desenvolvimento, sobre os relatórios de acompanhamento exigidos pela ANP (Agência Nacional de Petróleo), sobre o pagamento das participações governamentais, sobre o conteúdo local e, não menos importante, sobre as penalidades no caso de cumprimento das regras do setor.
Observatório Eco: Qual a margem de investimento estimado? Qual o possível lucro a ser obtido pelos investimentos realizados?
Leonardo Miranda: Ainda há pontos a serem esclarecidos nas regras do regime de partilha, como por exemplo, a forma de cálculo do custo a ser deduzido, e consequentemente da produção a ser partilhada. Provavelmente esses pontos serão esclarecidos no modelo de contrato de partilha.
Observatório Eco: A forma de exploração desta riqueza escolhida pelo governo merece ajustes? Quais?
Leonardo Miranda: Não acredito. O modelo para o pré-sal está em desenvolvimento, restando ainda saber como serão o contrato de partilha e os editais. Portanto, ainda é cedo para julgamentos. Já as regras de concessão são bastante conhecidas, transparentes e bem aceitas na indústria.
Observatório Eco: A crise no mundo árabe, neste momento, pode fortalecer investimentos no mercado de petróleo brasileiro?
Leonardo Miranda: Sem dúvida crises globais afetam o preço do petróleo, e consequentemente o ritmo de algumas operações na indústria. Notadamente no mundo árabe, onde se concentra a maior parte das jazidas de petróleo. Mas crises vêm e vão, e a indústria de petróleo é de capital intensivo e de longo prazo. Além disso, boa parte das empresas de petróleo possue investimento diversificado em termos geográficos.
No caso brasileiro, a indústria no formato atual (de livre mercado) é bastante nova, portanto uma crise pontual com a que assistimos não deve interromper os investimentos exploratórios e de desenvolvimento respectivamente dos blocos e campos de petróleo. Por aqui, interessa muito mais saber o que vem pela frente em termos de edital de licitação e contrato de partilha.