Ada Pellegrini avalia resistência a nova ação civil pública
Roseli Ribeiro em 13 July, 2010
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A jurista Ada Pellegrini Grinover, com exclusividade, para o Observatório Eco, explica as razões que motivaram a rejeição, na Comissão de Constituição e Justiça, da Câmara Federal, do projeto de lei 5.139/2009, que dispõe sobre a nova lei da ação civil pública. Para ela a rejeição representa “um voto de protesto contra o sistema de ação civil pública atual”.
Ada Pellegrini Grinover argumenta que o projeto não modifica os pontos que foram levantados “falaciosamente” pelos opositores. Segundo ela, ao contrário, o projeto significa “um avanço em termos de interpretação, esclarecimento, e melhoria da questão da coexistência das ações individuais e coletivas”. Ela participa da Comissão de Juristas, que elaborou o anteprojeto de lei sobre a nova lei de ação civil pública.
Formada em Direito pela Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), onde fez seu mestrado, doutorado e deu aulas, na qualidade de professora titular de direito processual. Participou na elaboração de diversas leis em vigor, por exemplo, a lei da ação civil pública que surgiu em 1985 e o Código de Defesa do Consumidor, além de várias mudanças pontuais no Código de Processo Civil.
Atualmente é presidente de honra do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Processual) e diretora dos cursos de extensão e aperfeiçoamento da Escola Paulista de Direito.
Para a jurista, ainda existe possibilidade de que seja aprovado o projeto de lei 5.139/2009, contudo avalia que isso só pode acontecer no próximo ano. Recentemente, ela foi homenageada com o livro “Em defesa de um novo sistema de processos coletivos”, lançado pela Editora Saraiva, no qual diversos autores analisam os pontos importantes e inovadores que esse projeto representa em nosso sistema processual brasileiro. Veja com exclusividade, a entrevista que Ada Pellegrini Grinover concedeu ao Observatório Eco, com exclusividade.
Observatório Eco: O que aconteceu com a tramitação do projeto de lei da nova ação civil pública? Qual o motivo da rejeição?
Ada Pellegrini Grinover: Na verdade a questão foi política. Vou explicar as razões políticas que levaram à aprovação da lei de ação civil pública e do código do consumidor e agora a rejeição desse projeto de lei.
Quando fizemos o projeto de lei da ação civil pública, o Ministério Público deu seu apoio ao o projeto, fez um substitutivo conservando em grande parte o nosso projeto, em torno de noventa por cento, e deu apoio institucional muito forte, porque naquela época, o MP não era independente e autônomo, ainda dependia do poder Executivo. Eles buscavam um instrumento para se consolidarem. Apoiaram a lei de ação civil pública sem nenhum problema.
Quando tramitou o Código de Defesa do Consumidor, as disposições processuais ampliaram os processos coletivos. Contudo, na tramitação o que mais chamou a atenção foi a parte de direito material do código, as sanções administrativas, as sanções penais, a responsabilidade civil, a responsabilidade objetiva e a parte dos processos coletivos passou quase completamente incólume, ninguém levantou alguma objeção.
Observatório Eco: Mas agora…
Ada Pellegrini Grinover: Após vinte cinco anos de aplicação de processos coletivos, naturalmente, percebeu-se a importância das ações coletivas e da ação civil pública que incomodam muito a administração pública e as empresas.
Quando foi apresentado esse projeto de lei da nova ação civil pública os “lobbies” se organizaram e levantaram na Comissão de Constituição e Justiça argumentos falaciosos. Disseram que tinha sido ampliado o campo de abrangência da ação civil pública, o que não é verdade.
Disseram que tinha sido ampliada a legitimação para agir, o que não é verdade, que havia um desequilíbrio entre as partes, que havia um reforço desmedido da posição do Ministério Público.
Como já dissemos antes em nossa entrevista realizada no ano passado, o regime da coisa julgada favorece mais o demandado do que o demandante, nos interesses individuais homogêneos.
Na verdade, o que eles não querem é a ação civil pública, a rejeição do projeto significa uma resistência ao minissistema existente. Eles gostariam que não houvesse ação civil pública. E como não podem voltar atrás; somaram forças com argumentos completamente destituídos de fundamentos para rejeitarem esse projeto.
A rejeição na Comissão de Constituição e Justiça, na Câmara dos Deputados, foi um voto de protesto contra o sistema de ação civil pública existente. Porque o projeto não modificava esses pontos que eles levantaram falaciosamente e apenas constituía um avanço em termos de interpretação, esclarecimento, melhoria da questão da coexistência das ações individuais e coletivas. Esse projeto não representa em absoluto uma ruptura do sistema.
Observatório Eco: Muitos operadores do direito demonstram certo apego à lei da ação civil pública em vigor e à jurisprudência existente, rejeitando também um novo sistema. Por que isso ocorre?
Ada Pellegrini Grinover: Mas não se trata de um novo sistema. É um equívoco, muito grande, o sistema é apenas aperfeiçoado. Não é um novo sistema, não rompe o anterior. Apenas aperfeiçoa. Inclusive no projeto adotamos muitas posições que já existem na jurisprudência. Não havia porque fazer toda essa resistência.
Observatório Eco: Ao longo da tramitação a senhora já esperava essa resistência?
Ada Pellegrini Grinover: Esperava a resistência, mas não a rejeição, por poucos votos, dois ou três votos de diferença. Esperávamos a aprovação.
Observatório Eco: Inclusive ao longo da tramitação foram apresentadas quase 100 emendas.
Ada Pellegrini Grinover: Queriam desvirtuar todo o projeto.
Observatório Eco: A senhora acredita que exista uma maneira de reverter essa situação?
Ada Pellegrini Grinover: É muito difícil, porque no Plenário teremos que enfrentar as mesmas resistências. Acho inclusive que nem é o momento político de levar essa questão ao Plenário. Vamos aguardar uma nova composição da Câmara dos Deputados.
Observatório Eco: E o Ministério Público como recebeu essa rejeição?
Ada Pellegrini Grinover: O Ministério Público ficou muito contrariado e se manifestou a favor do projeto, inclusive há muitos membros do MP na Comissão de Juristas.
Observatório Eco: E a Comissão de Juristas, os colegas que trabalharam em prol deste projeto, o que eles sentiram?
Ada Pellegrini Grinover: Ficamos muito mal, inclusive fizemos um documento que acompanha o recurso do relator, deputado federal Antonio Biscaia, mostrando que a rejeição é indevida, um despropósito. E manifestamos nosso entendimento favorável ao projeto.
Saiu agora um livro, feito em minha homenagem, uma coletânea de artigos em defesa do projeto, em defesa de um novo sistema de processos coletivos.
Neste livro, na introdução faço a análise das vantagens gerais do projeto sobre o sistema existente, dos pontos específicos que foram melhorados, examino alguns retrocessos do projeto em relação ao nosso anteprojeto de código de processos coletivos, mas na conclusão menciono que a nova lei é absolutamente necessária, representaria um avanço ao minissistema atual, e por isso é muito oportuna a publicação da obra, “Em defesa de um novo sistema de processos coletivos”, que poderá interferir na apreciação do projeto quando for ao Plenário, já renovado.
Infelizmente, perdemos uma excelente oportunidade de avanço em nosso sistema processual.