Condomínios e a lei de resíduos sólidos

em 21 November, 2010


Artigo de Fabiano Santangelo.

 

Estima-se que menos de um terço dos condomínios no País faça a coleta seletiva de lixo, permitindo ao catador separar o orgânico do inorgânico, promovendo deste último à reciclagem. Também se sabe que a maior parte do lixo doméstico, tem seu percentual de orgânico, cada vez mais reduzido, enquanto há o aumento do inorgânico, especialmente no tocante às embalagens.

 

Mas o que antes era sinônimo de educação ambiental e responsabilidade social, agora é lei. Em agosto de 2010, foi sancionada a Lei de Resíduos Sólidos que na prática versa sobre o lixo em todas as suas formas, inclusive o lixo doméstico.

 

Sabemos que já existe a coleta seletiva que facilita a reciclagem e a logística reserva em pilhas, baterias e embalagens de agrotóxico.  Mas a nova lei vai muito adiante. Na verdade se cumprida, vai influenciar a maneira em que todos tratam o resíduo, ou lixo de todos os tipos. Aqui será citado o lixo do tipo doméstico, sendo este o maior interesse dos condomínios.

 

Dentre as inovações da Lei 12.305/2010, estão: a proibição da criação de lixões a céu aberto, e criação um procedimento de “logística reversa” estendendo o que hoje ocorre com as pilhas, a todo o tipo de resíduo. O fabricante de um determinado material (embalagem ou seu conteúdo, qualquer que seja), terá agora de se preocupar com o destino dele, depois de passar pela mão do consumidor final, o condômino, por exemplo.

 

A logística reversa é a “restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”. Na prática, isso significa que aquela embalagem de leite, a caixa de papelão, o pacote plástico, a latinha de cerveja ou a de conserva, tudo o que o morador de um apartamento hoje coloca num único saco de lixo, deve ser adequadamente coletado e enviado de volta ao empresário que a fabricou.

 

Já há empresas em todo o País criando subsidiárias específicas para a reciclagem e reaproveitamento de componentes.

Mas antes que o leitor pense “Isso já acontece”, deve-se destacar que agora é uma obrigação com penalidades e com incentivos. Aquele comportamento socialmente louvável da coleta seletiva (plástico, metal, papel e vidro) tomou maior fracionamento, devendo-se observar de qual empresa ou grupo econômico vem cada lata, ou vidro. A regulamentação da lei estabelecerá inclusive o prazo para implantação da logística reversa.

 

Sobre a regulamentação, numa linguagem simplista, a lei no Brasil funciona da seguinte forma: A lei estabelece o que deve ser feito (direitos deveres), e o Decreto (regulamentação) estabelece como isso deve ser feito. Poderá haver ainda as normas infra-legais, no caso de órgãos ou conselhos, como o CONAMA, ou CONSEMA, CONTRAN, entre outros, visando aperfeiçoar a norma, como ocorreu recentemente com as cadeiras para crianças em automóveis, pelo CONTRAN.

 

A Lei 12.305/2010 ainda não foi regulamentada para explicar ao cidadão e empresário como ela será cumprida, e a previsão de regulamentação seria na expectativa do Presidente da República, de 90 dias a partir da sua sanção. Assim, nos próximos dias após esta edição, deverá ser regulamentada a lei, através de decreto federal.

 

Mas a lei traz outras novidades: Também distingue resíduo de rejeito, sendo este último aquele que não pode ser reaproveitado, e estabelece norte de comportamento: A seguinte ordem de prioridade deve ser observada quanto á geração de resíduos sólidos: “não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”. Ou seja, o aterro sanitário será a última opção, e não a primeira, como é hoje em muitas cidades.

 

Também foi criada a obrigação ao “setor empresarial” de, independente de coletar, ou conseguir reaproveitar, ter de dar uma destinação adequada, obedecendo á ordem de ser o aterro, a última opção.

 

As empresas terão de se adaptar e criar novos materiais leves, biodegradáveis, ou manter postos de coletas, assim como hoje ocorre quanto ás pilhas. Poderão se associar para facilitar o processo. Todos estes detalhes serão determinados na regulamentação.

 

Em face do aumento do custo de embalar, pois o empresário irá gerar um passivo para sua empresa, haverá mudança nas quantidades dos produtos, e incentivo á compra a granel. Podemos imaginar a aquisição de “amaciante de roupa”, através da recarga da embalagem vazia, como ocorre com a água mineral de vinte litros, por exemplo.

 

Mas onde isso afeta aos condomínios?

 

São os maiores produtores de lixo doméstico, dentre as residências. Isso porque justamente por estar num apartamento, é que absolutamente nada pode ter tratamento diverso do lixo, propriamente dito aquele que é ensacado.

Morar em condomínio é viver com necessidades e obrigações conjugadas. Daí pode concluir que a separação do lixo seja algo para que os condôminos terão de se adaptar, e os condomínios promover e cobrar.

 

A regulamentação da lei irá nos dizer como isso ocorrerá, e os efeitos podem não ser tão imediatos. Mas o quanto antes os condomínios se prepararem para a adequada coleta seletiva, permitindo que empresas pratiquem a logística reversa, menos será impactante ao modo de vida atual.

 

Merece o assunto ser desde já debatido em reuniões ou assembléias, já com olhos voltados, ao mínimo, qual seja a coleta seletiva, que certamente será parte do processo. Naturalmente que os condomínios não poderão ser obrigados e separar seu lixo por fornecedor ou fabricante, mas devem preparar-se para viabilizar que alguém o faça. No caso a lei já estabelece que os catadores terão seu espaço e sua função garantidos em todo esse sistema que será implantado.

 

Os condomínios poderão prever desde já uma separação do lixo, que vai além do orgânico do Inorgânico, estabelecendo punições para condôminos infratores da norma, quando for regulamentada. Deverão prever alterações no local de disposição, que certamente não poderá ser preenchido com sacolas plásticas cheias de tudo ou qualquer coisa.

 

Sacolas coloridas (enquanto ainda forem usadas) poderão ser um incentivo á separação do tipo de resíduo. Lembrando também que a lei prevê incentivos fiscais ás pessoas físicas e jurídicas; Qual condomínio não gostaria de ter redução de seu IPTU, por exemplo?

Ora, se o condômino não se adaptar ás novas normas, poderá perder seu desconto no condomínio, oferecido á quem executar a coleta seletiva.

 

Certamente surgirão ótimas idéias dentro de cada assembléia, quanto á forma de incentivo á cada condômino a cumprir sua parte no processo. Mas será um assunto a mais para o síndico se preocupar: O cumprimento pelo condomínio das normas relativo ao resíduo sólido, o lixo doméstico.

 

Devem-se observar também os limites legais bem como as co-obrigações do condomínio para com os condôminos e terceiros, em decorrência da lei.

 

É importante o síndico atentar para o seguinte: A lei estabelece que “poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade” aumentando também a participação do Município, que não vai somente contratar a coleta por licitação, repassar o curso ao morador, e depositar e qualquer lixão sequer licenciado pelo órgão ambiental.

 

E estabelece a responsabilidade compartilhada, que por um lado convida o cidadão a ser mais cidadão, comprometido e responsável. Mas por outro, permite que a culpa recaia sobre qualquer das partes envolvidas no processo (aqui se enquadraria o condomínio), similar ao que ocorre na matéria ambiental, por exemplo, em que não necessariamente o causador do dano é que tem de reparar, e nem sempre quem repara o dano, foi quem causou.

 

Isso conforme preceitua o artigo 51 da Lei: Sem prejuízo da obrigação de, independentemente da existência de culpa, reparar os danos causados, a ação ou omissão das pessoas físicas ou jurídicas que importe inobservância aos preceitos desta Lei ou de seu regulamento sujeita os infratores às sanções previstas em lei, em especial às fixadas na Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.”

 

Hoje, a maioria dos municípios do País possui o chamado lixão, sendo este o mais primitivo meio de destinação e tratamento de lixo. Outros já possuem o chamado aterro sanitário. Sobre isso a pretensão do legislador, é a extinção do aterro, como se houvesse percebido a mais verdadeira e assustadora das conclusões sobre o tema: Não haverá mais onde colocar o lixo, sem que isso polua o ar, a água (lençóis freáticos) e o solo.

 

Reporto-me a quem assistiu a animação de nome “Wall-E” em que o simpático robô permaneceu toda a sua existência prensando lixo dos humanos, num planeta já abandonado por eles. O alerta e a ironia da animação, apesar de distante e quase inimaginável, é merecido. Via de regra, a nossa percepção sobre o assunto só ocorre quando há greve ou paralisação da coleta de lixo urbano.

 

E a lei 12.305/2010 como toda norma num sistema democrático, visa implantar um comportamento humano adequado à sua nova necessidade de convivência e co-existência.

 

No setor empresarial, o impacto será menos severo. Isso porque qualquer empresa precisa de uma licença ambiental para seu funcionamento, e no processo de obtenção desta licença, o resíduo industrial já é assunto de grande importância. Assim, a nova lei para o setor industrial inova principalmente no tocante à logística reversa.

 

Porém condomínios, por exemplo, não precisam de licença ambiental depois de sua implantação e não precisam de logística reversa em seu produto. Também se tratam de dezenas ou centenas de unidades residenciais juntas, e por essas razões as mudanças serão mais impactantes aos moradores, pois atinge seus hábitos.

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Aguardemos a regulamentação da lei, e como cidadãos, torcemos para que a nova lei não se torne somente mais um mecanismo de cobrança de taxas e aplicação de multas, mas sim traga progresso no assunto lixo.

 

Fabiano Santangelo, advogado em Santa Catariana.

 

(As opiniões dos artigos publicados no site Observatório Eco são de responsabilidade de seus autores.)




3 Comentarios

  1. Marcos, 14 anos atrás

    Fabiano, parabéns pelo artigo. Apenas gostaria de fazer um alerta para a questão da logística reversa de embalagens, como você colocou acima. Na verdade, “a embalagem de leite, a caixa de papelão, o pacote plástico, a latinha de cerveja ou a de conserva” ainda não estão sujeitas à logística reversa. Veja que a lei (art. 33, caput, I) impõe esse procedimento às embalagens de produtos perigosos, como óleos automotivos e agrotóxicos. Num segundo momento (art. 33, § 1º) é que a logística reversa poderá ser estendida a outras embalagens, como as que você citou, por meio de regulamento, acordos setoriais ou termos de compromisso entre o fabricante, importador etc. e o Poder Público.
    Abraços.

  2. Fabiano S., 14 anos atrás

    Prezado Marcos, muito obrigado.
    Tens razão quanto ao disposto no art. 33. No primeiro momento serão apenas aquelas as possibilidades lá elencadas sujeitas à logística reversa. Todavia o artigo que tem caráter mais prático do que jurídico, visa demonstrar o alcance que a norma poderá ter e o quanto poderá afetar aos condomínios, o que normalmente para um leigo (aqui me refiro ao condômino em geral) é sempre de difícil visualização, a intenção da lei. Por essa razão os exemplos são simplistas e que se aproximam ao máximo ao dia-a-dia do cidadão.
    Obrigado pelo comentário Marcos, foi proveitoso. Abraços.

  3. Lucelio Costa, 14 anos atrás

    Caro Marcos, quanto ao retorno das pilhas e baterias propriamente ditas, de quem seria a responsabilidade do retorno, o comércio ou, os fabricantes?
    Sei que na europa, existe no comércio urnas de postagens para as pilhas e baterias, ou seja, quando se vai comprar estes materiais, o consumidor já leva os usados e colocam nestas urnas que ficam normamente em frente as lojas. Seria o mesmo procedimento aqui no Brasil?
    Parabenizo-o pelo artigo, grande abraço.


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