Fim do descarte irregular de lixo depende da conscientização da sociedade

em 10 April, 2019


Lixo

A sociedade e governo precisam investir em campanhas de conscientização das pessoas como caminho para erradicar o descarte irregular de lixo nas cidades. Embora exista uma lei que trate do tema  “grande parte da população nem conhece a lei de resíduos sólidos ou sequer sabe da sua existência”, ressalta João Ferreira Netto, engenheiro e professor da ESEG (Escola Superior de Engenharia e Gestão).

Na avaliação do especialista, a “conscientização das pessoas” deve ser feita através de campanhas abrangentes em redes sociais, televisão e outros meios, como caminho para uma “mudança da mentalidade”. “Essa conscientização deve focar nas consequências que o descarte irregular do lixo pode trazer, de que forma pode afetar diretamente a vida das pessoas”, sugere Ferreira Netto.

O entrevistado também aponta que o poder público tem  “papel fundamental”  na criação de pontos de coleta para que a população saiba onde entregar seus resíduos de modo correto. Da mesma forma, as empresas poderiam de forma espontânea também se engajarem na questão, por exemplo, através de suas redes sociais.

Sobre a demora da implantação da logística reversa no gerenciamento dos resíduos sólidos no país pelas empresas  o especialista ressalta que é preciso criar um círculo virtuoso em prol dessa demanda. “A grande questão são as estratégias competitivas que as empresas adotam, se uma empresa adota as políticas, as divulga e mostra um engajamento ambiental, isso levaria suas concorrentes para o mesmo caminho, uma vez que traz ganhos para a imagem dessas empresas”, afirma. Veja a entrevista que o engenheiro João Ferreira Netto concedeu, por e-mail, ao Observatório Eco com exclusividade.

Observatório Eco: Como lidar com o descarte irregular de lixo? Como conscientizar a população acerca da importância do descarte correto de resíduos?

João Ferreira Netto: Quanto ao descarte irregular de lixo, fica muito mais fácil buscar sua redução através da prevenção ao invés de combater diretamente com operações de coleta urbana ou programas de requisição do lixo. Para isso, o principal passo a ser tomado é através da conscientização das pessoas e isso deve ser feito por meio de campanhas abrangentes em redes sociais, televisão e outros.

Essa conscientização deve focar nas consequências que o descarte irregular do lixo pode trazer, de que forma pode afetar diretamente a vida das pessoas. Um direcionamento seria focar em produtos mais críticos como eletrônicos e medicamentos.

Observatório Eco: O que pode ser feito pelo poder público para minimizar os efeitos do descarte irregular?

João Ferreira Netto: Além das campanhas de conscientização, o poder público tem papel fundamental na disponibilização de pontos de coleta para que a população saiba onde entregar seus resíduos.

Otimizar a instalação desses pontos de coleta é essencial para garantir uma maior abrangência de bairros e facilitar o acesso das pessoas a estes locais, semelhante aos que temos hoje nos EcoPontos.

Observatório Eco: A educação ambiental nunca foi objeto de esforço do poder público e isso tem um alto custo social. A lei de resíduos sólidos não deveria ser usada como indutora de novas práticas por parte da sociedade na questão do lixo?

João Ferreira Netto: Sem dúvidas, é preciso que haja uma quebra de paradigma, uma mudança da mentalidade das pessoas, que só seria alcançada através da educação. Grande parte da população nem conhece a lei de resíduos sólidos ou sequer sabe da sua existência. Sua divulgação é o grande ponto de partida para que a situação mude verdadeiramente.

Observatório Eco: Por que não há, por parte das empresas fabricantes, um investimento em campanhas de educação em prol da coleta seletiva e outras boas ações no gerenciamento dos resíduos sólidos?

João Ferreira Netto: Porque a lei os desobriga de cumprir esse papel de divulgador e, portanto, elas se limitam a investir nos processos de descarte e não em sua divulgação. A Lei de Resíduos Sólidos poderia também requerer o auxílio das empresas na divulgação destas operações de coleta, de forma relativamente simples, através, por exemplo, da propaganda em embalagens e nas redes sociais das empresas.

Observatório Eco: Parece que as empresas de modo geral, só praticam a logística reversa quando obrigadas efetivamente pela lei. A adesão aos acordos setoriais de logística reversa é uma obrigação legal, mas mesmo assim o esforço empresarial de adequação tem sido inexistente em sua avaliação?

João Ferreira Netto: Eu não diria inexistente, muitas empresas estão engajadas em melhorar a situação atual. Na minha visão isso acontece, entretanto, de maneira muito mais lenta que a necessária. A grande questão são as estratégias competitivas que as empresas adotam, se uma empresa adota as políticas, as divulga e mostra um engajamento ambiental, isso levaria suas concorrentes para o mesmo caminho, uma vez que traz ganhos para a imagem dessas empresas. Uma lei nesse caso pode estabelecer metas para acelerar o processo, é o que acontece em muitos setores da Europa, por exemplo, para reduzir os prejuízos ambientais originários das atividades humanas.

Observatório Eco: A lei federal de resíduos sólidos adiou, por várias vezes, o fim dos aterros irregulares. Isso prejudicou a aplicação e o respeito a essa legislação?

João Ferreira Netto: De certa forma passa a impressão de que não há o rigor na aplicação da lei. Os aterros irregulares trazem uma série de prejuízos ao meio ambiente e à sociedade como um todo e quanto mais tempo para que deixem de existir, mais difícil é reverter esses prejuízos.

Ademais, tão importante quanto o engajamento do poder público e das empresas em relação à conservação do meio ambiente é a demonstração de que existe esse engajamento, até como forma de incentivo a toda a sociedade, e esses adiamentos constantes não demonstram o compromisso firmado.

Observatório Eco: A logística reversa é uma estratégia adotada em outros países com sucesso no gerenciamento dos resíduos sólidos? Quais os exemplos de boas práticas na área?

João Ferreira Netto: As atividades de logística reversa têm sido cada vez mais estudadas e desenvolvidas justamente em função da necessidade de se gerenciar os resíduos sólidos e preservar o meio ambiente. Na teoria, a logística reversa usa um fluxo já existente para movimentação e troca de informações, porém no sentido oposto ao tradicional. Isso pode transmitir a ideia de que os custos podem ser marginais, mas não é bem assim e, portanto, não haveria esse desenvolvimento da logística reversa não fosse a necessidade de destinar da melhor maneira os resíduos sólidos.

A logística reversa pode ser vista como essencial para o gerenciamento dos resíduos sólidos pois permite que o manuseio destes materiais seja realizado por quem possui a capacidade e os instrumentos necessários para fazê-lo, ou seja, quem o produziu, quem conhece todos os componentes do produto descartado, sendo assim, é uma atividade fundamental para o sucesso do melhor tratamento dado aos resíduos sólidos. As boas práticas estão associadas justamente a possibilitar facilidade na re-entrada dos itens dentro da cadeia, uma vez que em geral isso deve partir dos clientes e usuários, que não o farão se houver complexidade.




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