Para Marina Silva, Código Florestal é uma caixa de Pandora
Da Redação em 2 June, 2012
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A aprovação do novo Código Florestal, mesmo com os vetos da presidenta Dilma Rousseff, significa, para a ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, a revogação de “mais de 20 anos de esforço de regulação e governança ambiental” no país. “Temos um Código Florestal que não é mais florestal, é um Código Agrário. O que está sendo avaliado é uma caixa de Pandora [caixa que, na mitologia grega, continha todos os males do mundo], com todas as maldades”, criticou.
Marina Silva participou nesta sexta-feira (01/06) de seminário sobre energia limpa, na Coordenação de Programas de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), que antecede a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que ocorre de 13 a 22 de junho no Rio.
A ex-senadora definiu o veto da presidenta Dilma Rousseff ao Código Florestal como “periférico e insuficiente”. Os pontos negativos mais importantes do novo Código Florestal são, na opinião da ex-ministra do Meio Ambiente, a manutenção da anistia para os desmatadores e a redução da proteção das áreas que deveriam ser preservadas, como manguezais, nascentes e margens dos rios. “Permaneceu o projeto do Senado, com agravamentos”, disse.
Marina ressaltou que o antigo Código Florestal tinha ajustes que haviam sido propostos para corrigir algumas situações de entendimento entre ambientalistas, produtores e governo. Ela citou, como exemplo, o cultivo de parreiras, macieiras e dos cafezais. Por serem culturas de ciclo longo e lenhosas, deveriam ficar aonde estão. “Quando nós concordamos com esse arranjo, eles disseram: então, também podem a pecuária, a agricultura de modo geral e o plantio de espécies exóticas e foi isso que ficou no texto do Senado”.
Marina disse que, nesse caso, uma transigência correta para atualizar o código sofre a colocação “de uma agenda do século passado, que é aumentar a produção pelo uso predatório dos recursos naturais”. Ela disse que não é justo o que está sendo feito com as florestas brasileiras. “Estão transferindo o passivo da agricultura para as florestas”.
A ex-ministra denunciou ainda a existência no Brasil de 120 milhões de hectares com uma pecuária improdutiva, que produz uma cabeça de gado por hectare, quando na Argentina são produzidas três cabeças por hectare. Ela acredita que se o país aumentar a eficiência para produzir mais, apoiado pelas tecnologias hoje disponíveis, seriam liberados cerca de 17 milhões de hectares para outros usos.
Outro problema, segundo Marina, é que o país produz um emprego a cada 400 hectares, quando existem tecnologias que permitem produzir um emprego a cada 80 hectares. “Estão transferindo a ineficiência do setor para as florestas. A biodiversidade, os recursos hídricos e a sociedade, de modo geral, estão pagando o preço por não serem enfrentados os gargalos da agricultura”.
Marina também criticou a postura contrária do governo brasileiro à criação de uma agência mundial ambiental em substituição ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), orgão de funcionamento semelhante à Organização Mundial da Saúde (OMS), por exemplo. “O que se quer, disse, é ficar no mesmo lugar. No lugar da inércia”.
Em comparação a 1992, quando ocorreu a Conferência da ONU para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio92), Marina avaliou que o cenário hoje é melhor, do ponto de vista da sociedade. “Nós estamos com retrocesso do ponto de vista do governo”. Ela mostrou-se, entretanto, otimista, no sentido de que esses retrocessos podem ser corrigidos e deixou claro que não tem atitude de oposição em relação à presidenta Dilma. “Espero que os rumos sejam corrigidos por quem tem o poder de corrigir, que é o próprio governo. A esperança não é a última que morre. É aquela que não deve morrer”.
Energia nuclear
No mesmo evento, Marina Silva reafirmou sua posição contrária ao emprego da energia nuclear pelo Brasil. “Não é uma energia segura, não se sabe o que fazer com os resíduos, e vai ficar, não como um legado, mas como um castigo para as futuras gerações”, disse.
Marina desmentiu que o custo da geração nuclear seja baixo. “É uma energia subsidiada com os impostos dos brasileiros para, ao invés de ser uma solução, ser um problema”. Segundo a ex-senadora, os investimentos que vêm sendo efetuados na área nuclear deveriam ser direcionados para outras fontes de geração. Lembrou que a Alemanha está abandonando o uso dessa energia.
Em sua palestra, Marina destacou que o Brasil precisa pensar em energia limpa no contexto atual das crises que o mundo vive, e que são de ordem não só econômica, mas social, ambiental, política e de valores. Trata-se, externou, de “uma crise civilizatória”. Segundo ela, a crise de valores permeia todas as demais.
Segundo Marina, a reversão dos problemas trazidos pelas mudanças climáticas depende de governo e sociedade estarem conscientes das escolhas que fazem. Para o setor energético, em especial, indicou que deve haver uma democratização do planejamento. Foi dessa forma, garantiu, que, em sua gestão à frente do Ministério do Meio Ambiente, no governo Lula, o país conseguiu alcançar mais de 80% de redução do desmatamento.
No caso particular das hidrelétricas e do setor energético como um todo, devido aos impactos causados por esse tipo de empreendimento, salientou a importância dos investimentos intangíveis, por meio da valorização do patrimônio imaterial, representado por cerca de 220 povos que falam 180 línguas, com conhecimentos tradicionais e milenares, associados aos recursos naturais existentes.
“Essas culturas estão sendo ameaçadas”, declarou, indicando o caso dos índios da Amazônia e de regiões remotas do país, onde estão localizados 64% do potencial hidrelétrico brasileiro.
A ex-ministra defendeu que haja no Brasil uma coautoria de planejamento e decisões envolvendo governo, sociedade civil e academia. A sociedade, para ela, tem que ser consciente, engajada e pró-ativa. “Isso, assegurou, só é possível com democracia”. Para ela, esse planejamento democrático conduzirá à eficiência energética do país, como já vem ocorrendo desde o apagão de 2001. Com informações da Agência Brasil.