Direito ambiental impulsiona a economia verde
Roseli Ribeiro em 15 November, 2011
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Um dos eixos centrais da próxima Convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre desenvolvimento sustentável, que acontece no Rio de Janeiro, em junho de 2012, a Rio + 20, é a economia verde. Em 1987 com o lançamento do Relatório Brundtland, elaborado por cientistas e renomados estudiosos a questão ambiental foi colocada definitivamente lado a lado com a variável econômica. Se por um lado, os elementos chaves da equação foram identificados, o objetivo ambicionado – permitir ao homem produzir de forma a não esgotar os recursos naturais e preservar o Planeta – ainda não é o resultado de uma equilibrada equação.
Ainda que no campo abstrato seja fácil definir os contornos da economia verde, ou seja, o desenvolvimento sustentável acontecendo com baixa emissão de carbono, uso eficiente dos recursos naturais e a não degradação do meio ambiente, difícil é decifrar os contornos dos caminhos que nos levam à realização desse sonho verde.
E um desses caminhos em busca da economia verde passa pelo Direito Ambiental. Para tratar desta relação economia verde e direito ambiental o Observatório Eco entrevista a advogada Daniela Stump, especialista em Direito Administrativo pela GVlaw (Fundação Getúlio Vargas), atua na área ambiental no escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice e faz mestrado em Direito Ambiental na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Para a especialista não existe economia verde espontânea, pois dificilmente o mercado vai buscar as respostas mais custosas na produção de seus produtos. Segundo Daneiela Stump, é necessário que o Direito oriente a economia para que o mercado produza bens benéficos ao meio ambiente e a Política Nacional de Resíduos Sólidos no país é “um bom exemplo de política indutora da economia verde”.
Observatório Eco: Dentro da ótica do direito ambiental, o que significa economia verde?
Daniela Stump: Para muitos, a economia verde seria aquele desatrelamento do crescimento econômico da utilização dos recursos naturais e das emissões atmosféricas. Ou seja, é o crescimento, o desenvolvimento mais eficiente, onde é possível a produção de mais com menos utilização dos recursos naturais.
Alguns já criticam esse conceito, como José Eli da Veiga, professor da USP, dizendo que isso pode ter um efeito bumerangue. Porque reduzindo a utilização de recursos naturais na produção, pode ser que ocorra um aumento do consumo de bens, devido, por exemplo, ao crescimento da população, a renda das pessoas que cresce incentivando o consumo e de qualquer jeito, mesmo com uma produção mais eficiente pode ocorrer o aumento do uso dos recursos naturais e das emissões atmosféricas.
Concordo com essa crítica, pois para que haja a economia verde é preciso ter a diminuição do uso dos recursos naturais, mas temos que atacar o consumo também. Se mantivermos um padrão elevado de consumo, a ecoeficiência não vai dar conta da produção destes bens.
A economia verde além de ser mais eficiente, não pode só promover a ecoeficiência, mas promover o mercado de bens e serviços, no sentido de que quanto mais consumirmos, mais estaremos protegendo o meio ambiente.
Observatório Eco: E de que forma isso pode acontecer? Como o Direito surge nesse cenário?
Daniela Stump: Um exemplo destes bens e serviços é a logística reversa, e aí entra o papel do Direito, os bens e serviços que são efetivamente benéficos ao meio ambiente, ou seja, quanto mais você consome, mais você protege, eles não são espontâneos no mercado.
É preciso que o Direito Ambiental seja um propulsor deste mercado. Uma política indutora feita pelo Direito, porque o mercado, ele vai pelo caminho mais fácil. Ele não vai procurar as alternativas mais custosas para produzir. É preciso que o Direito oriente a economia para que o mercado produza bens benéficos ao meio ambiente.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos é um bom exemplo de política indutora da economia verde. Quando ela obriga os fabricantes, os produtores de pilhas e baterias, por exemplo, a fazerem a logística reversa, coletarem os bens pós-consumo, isso faz gerar uma nova economia, criando cooperativas que façam a coleta destes produtos, empresas que vão reciclar esse material, ou reutilizar.
É um serviço feito em prol do meio ambiente, mas esse serviço não aconteceu espontaneamente, precisou de uma lei que orientou esse mercado. Esse é um bom exemplo de economia verde, onde o direito foi o propulsor, na verdade não existe economia verde espontânea.
Todos esses movimentos que vemos desde 1992, a Convenção Quadro de Mudança do Clima, a Convenção da Biodiversidade, mostram que após a entrada destas questões internacionais no ordenamento jurídico brasileiro é que começam a surgir os contornos da economia verde. Não dá para esperarmos que o mercado, por si só, crie esses bens e serviços.
Observatório Eco: Mas então o que muda do conceito de economia verde para desenvolvimento sustentável?
Daniela Stump: Muitos críticos dizem que economia verde é só mais uma roupagem, utilizada para maquiar a economia como ela já existe.
Mas é importante a expressão economia verde porque ela chama atenção para um tripé que anda esquecido na sustentabilidade que é o pé econômico, tem o meio ambiente, o social, mas para ser sustentável, que ter que ter o pé econômico.
Observatório Eco: Há outros exemplos de leis que incentivam a aplicação da economia verde?
Daniela Stump: Outro exemplo é Política Nacional de Mudanças Climáticas que é de 2009, que foi bastante influenciada pelas negociações internacionais.
Desde 2000 o Brasil tem se beneficiado do mecanismo de desenvolvimento limpo, com base no Protocolo de Kyoto, que permite aos investidores estrangeiros implementarem os projetos de redução de emissões no país, e se valerem dos créditos de carbono para cumprirem suas metas.
Inclusive, desde a COP 13, que aconteceu em Bali, em 2007, o Brasil e outros países são bastante cobrados para assumirem suas metas de redução de emissões, ou seja, esses países já se beneficiaram do mecanismo de desenvolvimento limpo e agora é necessário um esforço adicional. Os países emergentes também estão emitindo muitas emissões, no caso do Brasil, em razão do desmatamento, a partir dessa COP, o país acabou assumindo internacionalmente compromissos voluntários em 2009, e internamente por meio de uma lei federal define sua meta de reduçao de emissões.
Observatório Eco: Graças ao cenário internacional, o Brasil voluntariamente assume um compromisso, que internamente foi fixado por uma lei.
Daniela Stump: Exatamente, nosso compromisso é de diminuir em torno de 36, 8% a 39,1% nossas emissões com projeção até 2020, com uma divisão por setores. Ou seja, a política nacional adotou uma abordagem setorial, que foi uma abordagem moderna, por exemplo, não se escolheu a redução das emissões com base nos estados, mas sim por setores da economia.
Observatório Eco: E qual o setor mais cobrado dentro desta sistemática?
Daniela Stump: O setor de transportes é o mais cobrado, tanto nacional, como internacionalmente, um exemplo é a aviação. A regulamentação desse setor vem evoluindo na Europa, e no mercado europeu de emissões, feito para que o Protocolo de Kyoto seja cumprido, e lá nenhuma aeronave pode pousar ou decolar sem ter as suas emissões controladas, a partir de 2012.
Observatório Eco: E essa decisão européia também tem impacto para o Brasil?
Daniela Stump: Sim, é interessante observar que como o Brasil, a União Européia também adotou uma abordagem setorial, ou seja, eles poucos querem saber se determinado país participa ou não da União Européia.
Por exemplo, pouco importa se a empresa é brasileira, sueca ou chinesa, independentemente, as emissões da aeronave devem ser controladas dentro da União Européia. Essa iniciativa com certeza vai causar algumas discussões no comércio internacional.
Observatório Eco: E o Brasil de que forma lida com o compromisso de redução de emissões?
Daniela Stump: Por enquanto, aqui temos um compromisso legal, mas ainda falta estabelecer os planos setoriais, e também não podemos dizer que as empresas devem apenas observar o que está disposto na política nacional do clima, se a empresa tem uma atuação internacional, também precisa estar avaliando as mudanças regionais.
O brasileiro precisa acompanhar essas tendências, até para proteger o mercado interno, ou seja, a legislação também serve para mostrar para os outros países, que aqui também estamos preocupados com esses problemas e que nossa legislação exige também providências das empresas. O país não quer que os seus exportadores sofram retaliações lá fora.
Observatório Eco: A legislação fixando essas metas também impulsiona o empresário na busca por tecnologias verdes, que diminuem o impacto do uso dos recursos naturais.
Daniela Stump: Exatamente, inclusive no Brasil, a busca por tecnologia verde na área dos biocombustíveis é um exemplo de que o país também pode produzir sua tecnologia verde.
Não tem porque o país não criar leis ambientais que incentivem a tecnologia verde. Se a legislação não se preocupar em promover isso, então não será possível garantir que o Brasil vá realmente por esse caminho.
Observatório Eco: O direito ambiental também influência na busca pela erradicação da pobreza, por exemplo, com a recente lei que trata do projeto Bolsa Verde.
Daniela Stump: É interessante esse exemplo, aliás todo o incentivo legal para conservar a floresta em pé é importante, mas além de atrelar a preservação à erradicação da pobreza, não podemos deixar de atender àqueles que têm uma produção eficiente.
Tenho receio de atrelar somente à erradicação da pobreza essa política de conservação da floresta, sem dar incentivo ao desenvolvimento. Por exemplo, a partir do momento em que a pessoa que ganhou o incentivo por ser pobre ela também deixará em certo momento de ser pobre.
Logo, não podemos ter apenas um tipo de incentivo. Aquele que produz com mais eficiência também precisa ser estimulado a buscar mais eficiência, por exemplo, produzir mais por hectare, enfim incentivar também aquele que tem a capacidade para preservar.
Observatório Eco: O governo também pode usar mais o tributo verde para incentivar a economia, por exemplo.
Daniela Stump: Já temos o ICMs verde, e no Congresso Nacional há inúmeros projetos em tramitação com esses incentivos tributários, mas não estão indo muito para frente, no campo prático não temos muito exemplos.
Um exemplo de incentivo que pode vir a surgir é o mercado brasileiro de redução de emissões. A política nacional de mudança do clima fixa que se as empresas brasileiras não conseguirem reduzir suas emissões nas suas indústrias podem vir a adquirir os títulos de redução de emissões em outro campo, é uma espécie de MDL (mecanismo de desenvolvimento limpo) nacional que pode surgir. Mas ainda depende de implantação.
Por enquanto, o exemplo mais forte que temos de uma política ambiental incentivando a economia verde é a Política Nacional de Resíduos Sólidos, pois cria a possibilidade do mercado desenvolver novos serviços e produtos em prol do meio ambiente.
jacinto A J Leal, 12 anos atrás
A abordagem legal do tema economia verde chama atenção para minha área de atuação, trabalho no mercado atacadista de hortifrut e estamos passando por um período de mudança que requer esta reflexão em torno do direito ambiental que é a extinção do uso de caixas de madeira para transporte de frutas e hortaliças e o uso de caixas plásticas higienizadas. Acredito que nossos governantes deveriam ter mais firmeza quanto a este tipo de mudança pois esta se da em momento propicio as atuais tendências mundiais e vão de encontro com as definições da economia verde . A redução da necessidade de plantio de áreas de madeira para este fim e sua conversão em zonas de produção de alimento e ou destinação desta matéria prima para papel e celulose.
É uma forma de transferir matéria prima inovar no mercado diminuir proliferação e infestação de doenças fitopatológicas e pragas e conseqüentemente redução de pesticidas que contaminam o meio ambiente.
Ou seja, utilizar da legislação em âmbito nacional para esta mudança, mas com firmeza e a clareza do momento em que vivemos.
Espero que este comentário se torne visível a pessoas que possam realmente influenciar para que isto ocorra.
Jacinto leal Tec Agric