Divisão do Estado do Pará só por plebiscito, diz STF

em 25 August, 2011


O Plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, nesta quarta-feira (24/08), por unanimidade, que o plebiscito para o desmembramento de um estado da federação deve envolver não somente a população do território a ser desmembrado, mas a de todo o estado. 

A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2650, em que a Mesa da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (AL-GO) impugnava a primeira parte do artigo 7º da Lei 9.709/98.

Preconiza esse dispositivo que, nas consultas plebiscitárias sobre desmembramento de estados e municípios, previstas nos artigos 4º e 5º da mesma lei, entende-se por “população diretamente interessada” tanto a do território que se pretende desmembrar, quanto a do que sofrerá desmembramento.

A Mesa da AL-GO, entretanto, pretendia que a interpretação do conceito de “população diretamente interessada”, prevista no parágrafo 3º do artigo 18 da Constituição Federal (CF), que envolve a divisão de estados, abrangesse apenas a população da área a ser desmembrada, ao contrário do que dispõe o dispositivo impugnado. E que esta regra somente se aplicasse à divisão dos estados, não à dos municípios.

Alegações

A Mesa da AL-GO sustentava, entre outros, que a primeira parte do artigo 7º da Lei 9.709/98 afrontaria entendimento firmado pelo STF sobre o tema nas ADIs 478 e 733; violaria a soberania popular (artigos 1º e 14 da CF) e cercearia o exercício da cidadania (artigos 1º e 2º da CF), obstruindo o desmembramento de estados, por exigir a manifestação da população da área remanescente que não quer a separação.

Sustentava também que se na Emenda Constitucional 15/96 o Congresso Nacional não inseriu no parágrafo 3º do artigo 18 da CF a consulta das populações de todo o estado envolvido no processo de divisão, esta somente deve ocorrer no desmembramento de municípios.

Pela redação dada pela EC 15/96 ao parágrafo 4º do artigo 18 da CF,  ficou determinado que “a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por lei complementar federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos municípios envolvidos, após divulgação dos estudos de viabilidade municipal, apresentados e publicados na forma de lei.”

Voto

Em seu voto, o relator, ministro Dias Toffoli, manifestou-se pela constitucionalidade do artigo 7º da Lei 9.709/96 e pela improcedência da ADI. Segundo ele, o dispositivo impugnado pela AL-GO está em plena consonância com o artigo 18, parágrafo 3º da CF.

Ele refutou a diferenciação entre os casos de divisão de estados e municípios. No entendimento dele, a regra do plebiscito deve ser igual para ambos, sob o risco de se  ferir a isonomia entre os entes da federação.

Segundo o ministro Dias Toffoli, a alegação de que a parte remanescente do estado votaria contra o desmembramento não tem nenhum respaldo jurídico. Pelo contrário, também a parte remanescente é afetada e, portanto, tem de ser ouvida democraticamente.

O ministro relator lembrou que a legislação brasileira sobre divisão territorial é rígida e disse que a Emenda Constitucional (EC) 15/96 surgiu com o propósito de frear os excessos na criação de municípios.

O mesmo, segundo ele, ocorre com os estados. A criação de uma nova unidade afeta não só aquele estado do qual o novo pretende desmembrar-se, mas toda a federação. Por isso, sua criação depende, também, do Congresso Nacional.

Ele lembrou que a federação é a união indissolúvel entre os estados, os municípios e o Distrito Federal e disse que a legislação deve proteger a base territorial dos entes federados, pois a autonomia dos estados ocorre a partir de seu território, sobre o qual incide sua capacidade política. Segundo ele, a emancipação é, muitas vezes, uma eventual disputa por mais recursos e mais poder. Portanto, complementou o ministro, a lei não pode por em risco a harmonia federativa.

“Entendo que o artigo 7º a Lei 9.709/98 conferiu adequada interpretação ao artigo 18, parágrafo 3º da Constituição Federal, sendo, deste modo, plenamente compatível com os postulados da Carta”, afirmou o ministro Dias Toffoli em seu voto, ao julgar improcedente a ação.

“A previsão normativa, em verdade, concorre para concretizar, com plenitude, os princípios da soberania popular, da cidadania e da autonomia dos estados membros”, acrescentou. “Deste forma, contribui para que o povo exerça suas prerrogativas de autogoverno, de maneira bem mais enfática”, concluiu Dias Toffoli.

Votos

O ministro Luiz Fux acompanhou o relator. Ele disse entender que o legislador explicou com clareza o que quis dizer com população interessada. Para o ministro Fux, a norma questionada somente aumenta o grau de cidadania e homenageia a soberania popular.

A ministra Cármen Lúcia concordou com o ministro Fux. Ao contrário do que se alega na ADI, o que se tem é exatamente a ênfase na cidadania, disse a ministra, para quem a Constituição Federal diz que o cidadão deve ser ouvido nos casos de redesenho do poder em seu território.

O ministro Ricardo Lewandowski também acompanhou o relator. Ele frisou que o voto do ministro Dias Toffoli está em plena concordância e harmonia com resolução do TSE recentemente editada, sobre o plebiscito no Estado do Pará.

A expressão população diretamente interessada é da Constituição Federal originária, disse o ministro Ayres Britto, que também votou com o relator. Ayres Britto concordou com a afirmação do ministro Dias Toffoli de que a população diretamente interessada é aquela diretamente afetada nos seus interesses políticos, histórico-culturais, econômicos.

O ministro disse discordar da ideia de que todo país deveria ser ouvido no plebiscito para desmembramento do Estado do Pará. Isso porque, para Ayres Britto, o país como um todo não vai perder nada, continuará com o território íntegro. Diferente do caso do Estado do Pará, que pode perder muito se concretizado o desmembramento, afetando toda sua população.

O ministro Gilmar Mendes também acompanhou o relator. Ele fez questão de pontuar que é preciso evitar a manipulação da fragmentação das unidades federadas, que podem levar a prejuízos para a federação e o princípio democrático. O ministro disse entender, contudo, que a interpretação constante do voto do relator vem vitalizar ideia de federação enquanto cláusula pétrea.

O ministro Marco Aurélio também julgou a ADI improcedente, contudo assentou que a consulta deve ser ainda mais abrangente, envolvendo, portanto, a população de todo o território nacional.

Baseado na Carta da República, o ministro afirmou que os estados e os municípios de hoje têm participação em receitas federais e estaduais. “Ora, se há possibilidade de vir à balha um novo município ou um novo estado haverá prejuízo para as populações dos demais estados e dos demais municípios, e a razão é muito simples: aumentará o divisor do fundo alusivo aos estados e do fundo também referente aos municípios”, explicou.

Ao acompanhar o voto do relator e destacar o primor de sua fundamentação, o ministro Celso de Mello analisou a evolução histórica do tratamento constitucional dispensado ao tema, que qualificou de “extremamente sensível”. O ministro ressaltou que o julgamento da matéria deveria se orientar por dois importantes postulados constitucionais: o estado federal e a soberania popular. Para ele, sob a óptica de tais postulados, é evidente o interesse de todos os cidadãos com domicílio eleitoral no estado em participar da consulta popular.

“Tenho para mim que, sob a perspectiva desses dois postulados – o do sufrágio universal, que deriva precisamente do princípio da soberania popular, e o postulado da Federação – são diretrizes que devem orientar o julgamento da controvérsia que se instaura nessa sede processual. As modalidades de consulta, seja plebiscito ou referendo, representam garantias institucionais de preservação da soberania popular. Não é possível que haja uma atuação seletiva da Justiça Eleitoral, apoiada também numa opção seletiva feita pelo legislador, para que determinada parcela da cidadania venha a sofrer uma discriminação, que é ao mesmo tempo jurídica e política”, afirmou.  Com informações do STF.




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