A indústria do petróleo e o frágil meio ambiente

em 26 June, 2011


Durante as próximas décadas, “a questão central da indústria petrolífera é lidar com a emissão de gases que provocam efeito estufa, o que certamente afeta adversamente o meio ambiente”. A conclusão é da advogada e especialista em Direito Ambiental, Carol Manzoli Palma, que acaba de lançar pela Editora Millennium, a obra “Petróleo – Exploração, Produção e Transporte sob a Óptica do Direito Ambiental”, resultado de seu trabalho de mestrado desenvolvido na Universidade Metodista de Piracicaba (SP), na qualidade de pesquisadora da FAPESP, onde atuou de 2009 até 2011, no projeto de pesquisa intitulado “Petróleo: aspectos jurídico-ambientais”.

Para a advogada, a questão da prospecção sísmica marítima do petróleo merece mais atenção, pois determinados estudos apontam para possíveis danos aos animais marinhos, em especial as baleias. Por essa razão, ela avalia que a “comunidade jurídica tem ficado muito omissa” e que o assunto precisa de estudos.  

A especialista também aponta falhas na legislação americana que trata da exploração do petróleo, uma vez que em casos de acidentes, a justiça americana tem julgado essas ações dentro de um tempo de resposta inadequado.  

Em seu livro a autora reúne um histórico de ocorrências ambientais envolvendo o petróleo no Brasil fruto de sua pesquisa, que revela um “quadro preocupante”, pois, no País não há “uma base sistematizada de informações que pode ser facilmente consultada pelos cidadãos”, alerta.

Ela avalia como positiva a iniciativa da lei nº 12.351/2010, que trata da exploração e produção de petróleo sob o regime de partilha de produção em áreas estratégicas e da camada pré-sal, de instituir a obrigatoriedade de apresentação de inventário periódico sobre emissões de gases que provocam estufa. Por outro lado, a especialista ressalta que “o desafio tecnológico da profundidade do petróleo existente na camada pré-sal deve ser acompanhado pelo Direito Ambiental, onde certamente novos instrumentos legais hão de ser necessários à salvaguarda do meio ambiente”.  Veja a entrevista que Carol Manzoli Palma concede ao Observatório Eco com exclusividade.

Observatório Eco: A indústria petrolífera busca efetivamente aumentar a segurança na exploração e transporte do petróleo, seja no âmbito nacional e internacional? Podemos afirmar que o meio ambiente tem sido protegido efetivamente desta atividade?

Carol Manzoli Palma: De fato, a indústria petrolífera tem buscado aumentar a segurança na exploração e transporte de petróleo, em especial através de projetos inovadores no âmbito da ciência e tecnologia. Porém, negativamente, ainda circulam no Brasil, navios com casco simples, aumentando o risco de vazamentos de petróleo.

Há estudos que buscam viabilizar o sequestro e a captura de gás carbônico, que é injetado em formações geológicas do subleito marinho para estocagens de longo termo. Enquanto não houver solução definitiva, a questão central da indústria petrolífera é lidar com a emissão de gases que provocam efeito estufa, o que certamente afeta adversamente o meio ambiente, com as consequências que chamamos de efeito em cascata: o derretimento das geleiras, o aumento do nível do mar, o empobrecimento da biodiversidade, com o risco de extinção de animais, o deslocamento de populações costeiras e assim por diante.

Há também a questão da prospecção sísmica marítima. Determinados estudos apontam para possíveis danos aos animais marinhos, em especial baleias. Esta atividade, contudo, é essencial para constatação de novas jazidas de petróleo. As propostas existentes são de mitigação dos impactos, por exemplo, diminuição da força dos pulsos sonoros emitidos pela embarcação quando um animal for avistado, mas isso não é suficiente. Creio que esta área deveria ser mais estudada e a comunidade jurídica tem ficado muito omissa.

Observatório Eco: Em sua obra, a senhora apresenta um histórico de ocorrências ambientais envolvendo o petróleo no Brasil. Quais as reflexões que extraímos deste panorama? Quais os aspectos preocupantes deste levantamento?

Carol Manzoli Palma: A própria obtenção de dados sobre derramamentos de petróleo é um fator preocupante, pois não há, no Brasil, uma base sistematizada de informações que pode ser facilmente consultada pelos cidadãos.

Somente através de uma noção global destas ocorrências ambientais é que poderemos verificar os locais onde acontecem com mais frequência e combater suas causas.

Além disso, uma cobrança de posicionamento dos órgãos ambientais no que se refere à fiscalização, dar-se-á com a conscientização da população. Parece-me que a disponibilização de informações ambientais, em especial através da internet, é um aspecto que necessita de maior atenção.

Tais informações não se restringiriam à descrição do ocorrido, mas também no sentido de se acessar o material completo relacionado ao caso: autos de infração lavrados, autorizações, licenças, estudos e audiências envolvendo um oleoduto, uma plataforma ou um navio.

EUA e o Acidente no Golfo do México

Observatório Eco: Em seu trabalho, a senhora faz uma breve avaliação de casos judiciais internacionais envolvendo empresas transnacionais de exploração de petróleo. De forma geral, podemos avaliar que existe uma retração destas empresas no pagamento de indenizações por danos provocados ao meio ambiente? Um caso emblemático é o da Texaco no Equador?

Carol Manzoli Palma: A análise jurídica recaiu principalmente nos casos envolvendo o Direito norte-americano. O que se pôde verificar é que os instrumentos legais necessitam de melhoria, pois o sistema lá existente tem possibilitado um tempo de resposta inadequado do Poder Judiciário.  

No caso “Maria Aguinda x Texaco”, por exemplo, passou-se 10 anos discutindo a lide – pedidos de reparação por danos ambientais causados no território de povos indígenas do Equador, pela empresa TexPet, subsidiária da Texaco – na Corte Distrital de Nova Iorque e na Corte de Apelações do Segundo Circuito. Ao final, a Corte de Apelações entendeu que os Estados Unidos não eram o foro mais adequado para analisar o fato.

Minha pesquisa busca mostrar um pouco do contexto jurídico dos Estados Unidos e articular reflexões sobre a necessidade de alteração da legislação, em especial porque as empresas transnacionais estão presentes em diversos países, mas as reclamações são geralmente canalizadas no país da sede.

Observatório Eco: Quais os desdobramentos do acidente no Golfo do México?

Carol Manzoli Palma: Fomentou-se um debate sobre a necessidade ou não de alteração da legislação ambiental, como a Lei de Poluição por Óleo (Oil Pollution Act – OPA). Em meu ponto de vista, a Lei de Política Nacional Ambiental (National Environmental Policy Act), que é de 1969, é muito flexível, conforme demonstro em meu livro.

Esta norma poderia ser revisada e atualizada. Nem mesmo o estudo que foi conduzido para a região da plataforma Deepwater Horizon, havia analisado um vazamento contínuo de quatro meses. A hipótese de pior cenário contemplava apenas o vazamento da substância por um mês.

Há uma investigação criminal em curso para se determinar a culpabilidade dos envolvidos no vazamento e a OPA permite que, caso comprovados dolo ou negligência, não exista um limite máximo no valor da reparação dos danos ambientais, além, é claro das consequências criminais.

O acidente no Golfo do México também provocou atitudes de outros países. O Parlamento Europeu adotou uma resolução, em outubro de 2010, dispondo sobre medidas de precaução para atividades de exploração e produção de petróleo.

Regime do Pré-sal

Observatório Eco: De que forma a senhora avalia no âmbito jurídico de proteção ao meio ambiente a exploração do petróleo na camada do pré-sal no Brasil? 

Carol Manzoli Palma: A Lei nº 12.351/2010, de 23 de dezembro de 2010, que trata da exploração e produção de petróleo sob o regime de partilha de produção em áreas estratégicas e da camada pré-sal, instituiu a obrigatoriedade de apresentação de inventário periódico sobre emissões de gases que provocam estufa.

Outro elemento notável é a previsão legal de autoria ambiental em todo o processo de retirada e distribuição de petróleo proveniente da camada pré-sal.

Além disso, a criação do Fundo Social também é uma oportunidade para o investimento em pesquisa e tecnologia de inserção de energias renováveis em maior escala.

Eis uma questão interessante, pois embora o Brasil esteja em estado avançado no uso de energias renováveis, constatou-se, por exemplo, que a energia eólica representa menos de 1% da oferta interna, tendo o país, capacidade de produzir 25 vezes mais do que se gera atualmente.

Vejo que durante as próximas décadas, o uso correto e eficiente deste recurso, até que sua representatividade seja substituída por outras matrizes, deve seguir certos rigores. O Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA) é o mecanismo adequado para mensurar o impacto que uma nova atividade petrolífera trará, sendo certo que outros estudos que o substituam são inviáveis do ponto de vista legal e ambiental. 

Além disso, um estudo deve ser feito para cada caso e não por região, como se tem pretendido. Não há acolhimento jurídico para esta proposta. Os Planos de Contingência e Planos de Emergência devem ser acessíveis à comunidade em geral e sua eficácia constantemente avaliada pelo Poder Público.

O desafio tecnológico da profundidade do petróleo existente na camada pré-sal deve ser acompanhado pelo Direito Ambiental, onde certamente novos instrumentos legais hão de ser necessários à salvaguarda do meio ambiente.

 

 

Para saber mais sobre a obra: Petróleo – Exploração, Produção e Transporte sob a Óptica do Direito Ambiental, clique aqui.




1 Comentário

  1. Aymar Lucia Manzoli Aranda, 13 anos atrás

    As autoridades competentes e o povo deveriam trabalhar juntos na fiscalizaçao e resoluçao dos problemas relacionados ao meio ambiente. O mundo é de todos!


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