Lei pode deixar de proteger animais domésticos
Roseli Ribeiro em 12 June, 2011
Tuite
Tramita na Câmara Federal o Projeto de Lei nº 4.548/98 que pretende remover o artigo 32 da Lei de Crimes Ambientais (lei federal nº 9.605/98) deixando de reconhecer como crime os atos de maus-tratos praticados contra os animais domésticos ou domesticados. A iniciativa tem o apoio do deputado federal, Carlos Brandão (PSDB-MA), que inclusive pediu em 08/06, que o PL fosse incluído na pauta de votação. *No dia 13 de junho ele desistiu do pedido, retirando o requerimento.
Em breve pesquisa no portal ANDA (Agência de Notícias Direitos Animais), entre os dias 01 a 11 de junho deste ano, identificamos muitas notícias que revelam atos de maus-tratos contra animais. Veja alguns exemplos de atos bárbaros retirados do site: em Rio Preto (SP) associações denunciam chacina de gatos. Pelo menos 50 animais foram encontrados mortos e outros 18 animais desapareceram. Em Rio Claro (SP), mais um cão da raça pitbull foi covardemente espancado e abandonado na área central do município. No Ceará cadela é encontrada amarrada e com os olhos pregados. Cavalo morre de fome em Piracicaba (SP), cansado, sem forças para lutar e sobreviver, cheio de feridas pelo corpo, algumas provocadas pelo peso da carroça, com muita fome e sede, o animal não suportou os ferimentos e morreu.
Ou seja, ainda que exista um artigo de lei protegendo a vida destes animais, atos desumanos continuam sendo praticados todos os dias contra esses seres. Se essa proteção deixar de existir em nosso ordenamento jurídico as conseqüências serão nefastas e hediondas.
Para tratar do tema o Observatório Eco entrevista o advogado Daniel Braga Lourenço, especializado em direitos dos animais. Formado pela PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), é associado ao ALDF (Animal Legal Defense Fund), como Professional Volunteer, e diretor jurídico do IAA (Instituto Abolicionista Animal). É autor da obra “Direito dos Animais: Fundamentação e Novas Perspectivas”.
Sobre o conteúdo do projeto de lei 4.548/98, Daniel Braga Lourenço é taxativo “representa um evidente retrocesso no que se refere à proteção dos animais em nosso país”. Para o especialista essa proposta “viola” a Constituição da República.
De acordo com o projeto, cães, gatos, coelhos, cavalos, pássaros, bois, galinhas, cabras, porcos, ovelhas e tantos outros animais ficarão sem proteção legal se forem vítimas de maus-tratos, ou seja, os autores dessas crueldades deixarão de responder criminalmente pelo ato praticado. “Não há lógica, bom senso, capaz de explicar por qual motivo alguns animais estariam protegidos contra abusos, maus-tratos, ferimentos ou mutilações e outros, igualmente passíveis de sentir dor, de ter as suas vidas prejudicadas, não; como se não fossem dignos da salvaguarda legal, seres menores, à margem do albergue da lei”, argumenta o advogado.
Em seu entendimento, falta engajamento formal do Poder Público na educação da população sobre o respeito aos animais. “O governo tem se mantido, salvo raríssimas exceções, absolutamente omisso quanto à real implementação de políticas públicas tanto na esfera da prevenção como da punição daqueles que praticam atos abusivos ou cruéis contra os animais”, ressalta o especialista. Veja a entrevista que Daniel Braga Lourenço concedeu ao Observatório Eco com exclusividade.
Observatório Eco: Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 4548/98 que propõe que seja removido do artigo 32 da Lei Federal nº 9605/98 (Lei de Crimes Ambientais) a criminalização de atos de maus-tratos a animais domésticos ou domesticados. Qual a sua opinião sobre esse Projeto?
Daniel Braga Lourenço: Este Projeto de Lei representa um evidente retrocesso no que se refere à proteção dos animais em nosso país. Tecnicamente, o PL n.º 4.548/98 viola materialmente a Constituição da República, frontal ou patentemente a regra disposta no art. 225, § 1º, VII, mas não menos agride o princípio da isonomia, o princípio da razoabilidade, o princípio da vedação da proteção deficiente, além de vulnerar a norma proibitiva de retrocesso sócio-ambiental.
Observatório Eco: Iniciativa desta foi considerada constitucional pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal?
Daniel Braga Lourenço: O relator da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania- CCJC, ao examinar a constitucionalidade de tal proposição, afirmou que: “[...] por erro de interpretação da norma contida no art. 32, da Lei nº 9.605/1998, decisões do Poder Judiciário estão impedindo a realização de eventos regionais, arraigados na cultura popular brasileira, como rodeios, cavalhadas, vaquejadas e a pesca esportiva”.
Para o relator, o projeto estaria, portanto, em consonância com o texto do § 1º, do art. 215, da Constituição Federal, que protege as tradições populares ao dispor que “o Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional”. Nada mais equivocado.
Observatório Eco: Esse projeto fere o artigo 225, § 1º, VII, o qual veda práticas cruéis contra animais não humanos?
Daniel Braga Lourenço: Como disse, não há lógica, bom senso, capaz de explicar por qual motivo alguns animais estariam protegidos contra abusos, maus-tratos, ferimentos ou mutilações e outros, igualmente passíveis de sentir dor, de ter as suas vidas prejudicadas, não; como se não fossem dignos da salvaguarda legal, seres menores, à margem do albergue da lei.
Pelo contrário, pelo que deflui claramente do texto constitucional a melhor interpretação do artigo 225, § 1º, VII, da Constituição Federal, indica claramente um amplo espectro protetivo, não tendo feito o legislador constituinte qualquer restrição aos animais domésticos ou domesticados.
Não é por outra razão que, o Decreto n.º 24.645/34 já assinalava claramente nesse sentido ao trazer no seu art. 17 a definição legal de animal, englobando-se nela tanto os animais domésticos como os silvestres. Não bastasse isto, arrola em seu art. 3º, uma série de práticas que devem ser tidas por abusivas ou cruéis e logo em seu inciso I afirma que é um ato punível “praticar ato de abuso ou crueldade em qualquer animal”.
A própria Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, Lei n.º 6.938/81, em seu art. 3º, inciso I, ao definir meio ambiente afirma que ele é o “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Não resta qualquer dúvida de que todas as espécies, no nosso caso, todas as espécies de animais estão abraçadas pelo conceito legal de meio ambiente e, portanto, dentro da moldura constitucional por mais essa razão.
Não resta dúvida, portanto, que ao tratar explicitamente do princípio da proteção dos animais, a Constituição brasileira apontou um norte, uma luz, uma indicação, um caminho que deve ser seguido pelo ordenamento jurídico, como um todo no sentido da mais ampla proteção dos animais como um todo, não fazendo ela qualquer ressalva ou distinção no que diz com eventuais subdivisões ou classificações que o legislador ordinário venha eventualmente a criar. Criou um patamar protetivo mínimo que diz com todas as espécies animais.
Observatório Eco: O senhor poderia dar um exemplo das conseqüências deste projeto, se vier a ser aprovado?
Daniel Braga Lourenço: Exemplificando. A prosperar o projeto de lei em comento, se alguém, nos termos do art. 32 da Lei n.º 9.6058/98, mutilar uma onça pintada, cortando uma ou mais das suas patas, cegando-a, incorrerá em ação criminosa; porém, se fizer o mesmo com o seu cão ou gato, não haverá crime. O que o PL n.º 4.548/98 almeja é estabelecer uma discriminação irrazoável, que fere sob todas as luzes o sentido da isonomia que deve presidir os julgamentos do Direito.
O projeto de lei em pauta regride a um estágio anterior de concretização em relação ao patamar de patrocínio já alcançado. Retirar os animais domésticos ou domesticados de um grau de arrimo que já possuem significa regressão, o que é constitucionalmente interdito fazer.
Na verdade, o referido PL tem um comprometimento escancarado, vergonhoso, por parte da bancada ruralista de nosso Congresso com a prática de vaquejadas, rodeios, cavalhadas, entre outras, atividades estas que utilizam precisamente os domésticos e domesticados, como bovinos e equinos.
Observatório Eco: Existe alguma previsão para a votação deste projeto? Na Câmara ou no Senado há iniciativas semelhantes como a deste PL 4548/98?
Daniel Braga Lourenço: Não há uma previsão concreta para a votação. Em fevereiro deste ano, o projeto de lei foi desarquivado em virtude do requerimento de n.º 218/2011 apresentado pelo Deputado Roberto Santiago, representante do Partido Verde, estando pronto para a Ordem do dia do Plenário em face da prévia aprovação na Comissão de Constituição e Justiça. Há outros Projetos de Lei que tramitam e que tratam de situações análogas a esta. Exemplo disto é o PL n.º 5.952/2009 que sinaliza para o restabelecimento do art. 64, do Decreto-Lei nº 3.688/41, configurando novamente a conduta de tratar animal doméstico com crueldade ou submetê-lo a trabalho excessivo como mera contravenção penal.
Observatório Eco: Recentemente, a mídia tem divulgado os maus-tratos praticados com os animais domésticos, crueldade que inclusive está crescendo, não seria o caso do movimento em defesa dos animais exigir que o governo faça campanhas contra essas práticas hediondas e ilegais?
Daniel Braga Lourenço: A resposta é clara no sentido da necessidade de engajamento formal do Poder Público na educação da população sobre o respeito aos animais. O que se constata, infelizmente, é que o governo tem se mantido, salvo raríssimas exceções, absolutamente omisso quanto à real implementação de políticas públicas tanto na esfera da prevenção como da punição daqueles que praticam atos abusivos ou cruéis contra os animais. Esta omissão revela uma opção implícita de nossos governantes de relegar esta importante questão como algo secundário, o que parece algo totalmente equivocado.
Observatório Eco: De que maneira a população pode se manifestar sobre a votação deste PL?
Daniel Braga Lourenço: As associações civis [as nossas ONG´s] já se movimentam há algum tempo para tentar impedir que esse projeto de lei seja aprovado. Nesse sentido, há vários abaixo-assinados circulando pela internet. Além disso, sugeriria o contato com os parlamentares no Congresso, por meio de suas assessorias para alertá-los desse retrocesso e, caso seja agendada a votação, para que façamos “barulho” em Brasília. Eu e o Prof. Fábio de Oliveira elaboramos recente parecer com o detalhamento da argumentação contrária ao referido PL e pretendemos encaminhar para o Congresso Nacional.
O portal Olhar Animal realiza campanha contra esse projeto no Facebook. Acesse Aqui.
*Atualizado em 14 de junho para adição de informação nova.
Angelo Prates Flores, 13 anos atrás
Como médico veterinário,sou totalmente contra esse P L de iniciativa do dep fed Carlos Brandão.Se êle fosse um animal será que iria gostar desse P L n. 4548/98
Maria Paz, 13 anos atrás
Diante do retrocesso em que somos obrigados a ler dos nossos políticos fico a perguntar o que podemos fazer de que forma podemos impedir estes desmandos, apenas não votar ou cobrar dos candidatos em que votamos. De que formas nos espiritas podem modificar este quadro, sabendo que temos responsabilidade por todos os seres existente no planeta.
Maria Paz, 13 anos atrás
Diante do retrocesso em que somos obrigados a ler dos nossos políticos fico a perguntar o que podemos fazer de que forma podemos impedir estes desmandos, apenas não votar ou cobrar dos candidatos em que votamos.
Délcio Rocha, 13 anos atrás
Isso é um absurdo!!! em prol da vida e do direito dos animais poucos se mobilizam…
Se o interesse desse deputado é ter 5 minutos de fama ele conseguiu!! espero que não necessite de voto para se reeleger… Como zootecnista, prof. universitário, vice diretor do Instituto Vida Animal -IVA farei uma campanha contra a reeleição desse individuo… “Conhece-se a educação e a cultura de um povo como esse trata seus animais”
sandro rosa, 13 anos atrás
Muito bom?, Partindo de um político sem noção alguma sobre a lei de proteção dos animais ou simplesmente sem noção alguma sobre o meio ambiente, só nos resta fazer campanha pesada para que este indivíduo sem noção nunca mais se elega. Por favor a todos, passem esta informação para o máximo de contatos, vamos tirar este infeliz da cadeira que ocupa. Temos que eleger quem defende as causas ambientais.
Sandro rosa/Geoarqueologia.
Andrea Santos, 13 anos atrás
Realmente não deveria ser necessário leis para assegurar direitos dos animais ou homens, mais o ser humano é tão cruel, que é capaz de matar sua própria espécie imagine os animais.
Guilherme, 13 anos atrás
“A grandeza de uma nação pode ser julgada pelo modo que seus animais são tratados.” (Mahatma Gandhi)
OBA Floripa! » Deputado federal retira pedido de votação de PL que exclui domésticos e domesticados da proteção da lei, 13 anos atrás
[...] [...]
Zélia Doneux Rebske, 13 anos atrás
Que absurdo! Que retrocesso!