Lei de crimes ambientais precisa ser refeita, diz jurista
Roseli Ribeiro em 8 August, 2011
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“Na lei de crimes ambientais houve excesso de criminalização”, fato que banaliza a conduta criminosa no âmbito penal ambiental, a avaliação é do criminalista e jurista Luiz Flávio Gomes. Para o professor, a lei precisa ser repensada, as penas de prisão devem ser substituídas por outras formas de punição. As condutas criminosas devem ser solucionadas de forma consensual e rapidamente, tendo como objetivo a imediata recuperação do meio ambiente.
Luiz Flávio Gomes é doutor em Direito Penal pela Universidade de Madri, mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo. Atualmente, diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura que leva seu nome, ele é mais conhecido pela criação da Rede de Ensino LFG, especializada na formação de alunos para os concursos de carreiras públicas e exames da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que agora opera dentro do Grupo Anhanguera na área de graduação a distância.
Aproveitando as recentes mudanças na legislação penal, a lei 12.403/2011, que altera o Código de Processo Penal e modifica temas como a prisão processual, fiança, liberdade provisória e demais medidas cautelares, Luiz Flavio Gomes defende que em caso de crimes ambientais o valor da fiança sempre deve ser o mais elevado possível. As fianças devem ser estipuladas em patamares altíssimos de R$ 1 milhão ou R$2 milhões, sendo que o dinheiro arrecadado deve ser aplicado exclusivamente em projetos de recuperação do meio ambiente.
A lei 9.605/98 é um dos temas preferidos em concursos públicos, especialmente, para ingresso no Ministério Público, – a aplicação da lei em crimes provocados por pessoas jurídicas – continuamente freqüenta os certames. Por outro lado, o tema penal ambiental não tem merecido atenção nas provas aplicadas pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Veja a entrevista que Luiz Flávio Gomes concede ao Observatório Eco com exclusividade.
Observatório Eco: Qual a sua avaliação da lei de crimes ambientais?
Luiz Flávio Gomes: O Direito penal quando não existe, não atua, se toda conduta vira crime, acontece a banalização da conduta criminosa. Ou seja, o crime ambiental banalizou, porque tudo virou crime.
Precisamos enxugar os tipos penais. O mundo tem em média 6 tipos penais, o Brasil tem 70, ou seja, muitas condutas são administrativas e não é correto virar tipo penal, embora o meio ambiente deva ser protegido, e ninguém duvida dessa importância.
Temos que enxugar todas essas condutas e ficar apenas com as condutas mais graves, que realmente sejam ações criminosas, para fortalecer a lei. Para condutas que não são tão graves devemos aplicar penas alternativas, ou seja, formas consensuais de litígio.
Isso de certa forma já é feito no âmbito ambiental por meio do TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), isso já é feito, porém não está bem disciplinado. Precisamos disciplinar bem essa alternativa, buscar logo o acordo e liquidar o assunto o mais rápido possível exigindo a recuperação imediata do meio ambiente, replantar o que deve ser replantado, despoluir.
Buscar soluções imediatas, consensuais, de forma rápida. Só casos gravíssimos devem ser considerados crimes ambientais, um vazamento que acabou com todo o rio, nesse caso não tem como fazer acordo, deve ser aplicada uma pena séria, porém jamais a pena de prisão.
Temos que pensar em outras penas para os casos de crimes ambientais, prisão domiciliar com monitoramento eletrônico, não adianta pensar em cadeia. Podemos pensar em penas pecuniárias fortíssimas, fazendo um fundo a favor do meio ambiente exclusivamente, ou seja, dinheiro em favor da Natureza, esse pode ser um caminho.
Observatório Eco: Existe algum país, na Europa, por exemplo, que faça dessa forma?
Luiz Flávio Gomes: Na Europa, cerca de 80% dos países aplica penas alternativas, para tudo isso, penas alternativas. Na Alemanha, 85% das penas são alternativas, para esses crimes, sobretudo não há prisão. Portanto, o Brasil precisa reconhecer logo que não é caso de pena de prisão, fixar novas sanções, sobretudo a reparação dos danos ambientais.
Observatório Eco: Na lei de crimes ambientais, a média de penas de prisão são em torno de 4 anos, é raro o caso em que a pena de prisão seja superior a 4 anos.
Luiz Flávio Gomes: Muito raro encontrarmos casos acima de 4 anos, e no Brasil em crimes até 4 anos cabe a aplicação de penas substitutivas. Precisamos fazer um quadro de penas efetivamente exeqüíveis, também não adianta prever penas que depois ninguém fiscaliza o cumprimento.
O juiz também não aplica esse tipo de pena. Uma alternativa possível é fixar fianças altíssimas para essas condutas, uma fiança agora pode ser fixada em até R$ 109 milhões.
Observatório Eco: Até porque nesses crimes também se aplicam as novas regras penais recentemente em vigor.
Luiz Flávio Gomes: Exatamente, as novas regras também se aplicam. Ou seja, podemos exigir em crimes ambientais, fianças altíssimas de R$ 1 milhão, R$ 2 milhões, por exemplo. E reverter todo esse dinheiro efetivamente somente em prol do meio ambiente. Reverter para projetos de ONGs, do governo.
Observatório Eco: De que forma é aplicada a lei de crimes ambientais em caso de pessoas jurídicas? A lei funciona efetivamente nessas situações?
Luiz Flávio Gomes: A pessoa jurídica tem que ser efetivamente punida. Atualmente muitas pessoas jurídicas são denunciadas, mas ela não pode ser denunciada sozinha, uma pessoa física que praticou o crime tem que ser denunciada em conjunto.
Mas ainda há muita discussão se a pessoa jurídica pública, por exemplo, como a Petrobras pode ser punida de acordo com a lei penal ambiental. Em minha opinião sim. Há forte corrente nesse sentido, sendo um absurdo não se colocar essas empresas no rol ambiental criminal.
Observatório Eco: Nos concursos públicos a lei 9.605/98 é bastante explorada nas provas?
Luiz Flávio Gomes: Esse é um tema que cai muito nas provas. É uma lei importante e bastante explorada nos concursos. Principalmente, a responsabilidade da pessoa jurídica, recentemente em umas das provas foi questionado se é possível processar apenas a pessoa jurídica. A resposta é não, temos que processar os dois, a pessoa física e jurídica. Provas para o Ministério Público exigem tudo sobre meio ambiente, é um tema concorrido.
A aplicação do principio da insignificância também é bastante explorado. Por exemplo, cortar uma árvore é crime? Pescar três peixes é crime? São polêmicas freqüentes na área ambiental.
Observatório Eco: Por outro lado, é perigosa a aplicação freqüente desse principio, pois se um pescar 3 peixes, depois outra pessoa, e assim sucessivamente há o dano efetivo ao meio ambiente em razão da proporção.
Luiz Flávio Gomes: Mas daí entra em campo o fator preventivo da administração pública. Tem que existir a fiscalização, agora se mil pessoas estão pescando, então o poder público tem que agir. Ele não pode ignorar que mil pessoas estão pescando, tecnicamente chamamos isso de delitos cumulativos, ou seja, um sozinho é nada, mas se mil estão burlando a lei, isso já se torna um caso preocupante.
É como a poluição de um carro, apenas um carro é insignificante a poluição, pois não vai afetar o pulmão de alguém, mas se somarmos os 6 milhões de carros na capital de São Paulo, daí com o acúmulo, a situação fica séria.
Observatório Eco: E nas provas da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) o tema penal ambiental é exigido?
Luiz Flávio Gomes: Não são muitas questões sobre o tema, normalmente a OAB deixa de fazer questões sobre o tema.
Observatório Eco: A lei penal ambiental merece ser aperfeiçoada para a melhor proteção do meio ambiente?
Luiz Flávio Gomes: Eu não jogaria as minhas fichas só na parte criminal, apostaria na parte preventiva civil-administrativa, com medidas mais eficazes.
georgia, 13 anos atrás
de que forma a sociedade pode se tornar mais ativa e menos omissa nas questões ambientais?